Metal Gear Solid V: a dor fantasma de um game inacabado

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Falta alma em Metal Gear Solid V: The Phantom Pain. Foi a esta triste conclusão que cheguei depois de muito pensar sobre o game como um todo e, principalmente, seu decepcionante final. Analisado apenas como um jogo, ele é muito bom, a jogabilidade está excelente e é possível passar horas jogando sem perceber, mas a franquia sempre foi muito mais que apertar botões. Até mesmo os primeiros jogos, lá no MSX, tinham uma história interessante e complexa. Já em MGSV parece que todo o tempo e dinheiro da produção foram gastos apenas na criação e aprimoramento da Fox Engine, fazendo com que a parte da história do jogo ficasse inacabada. Graficamente o resultado foi excelente, com personagens muito realistas e cenários belíssimos e detalhados, mas a sensação final é de que faltou alguma coisa ali no meio disso tudo. O jogo é ruim? Claro que não, ele é bastante divertido de ser jogado, mas também não é essa maravilha toda que muitos sites especializados vem pregando por aí.

Muita gente estranhou quando disseram o que o game teria uma espécie de mundo aberto, afinal, a série sempre se focou em invadir bases fechadas, mas até que a coisa flui bem aqui. A verdade é que o mundo aberto de MGSV serve apenas para ligar as bases e postos avançados dos inimigos, sem muita coisa para fazer entre um e outro. O jogador vai passar grande parte do tempo indo de uma base a outra para executar a próxima missão. E aqui fez muita falta um sistema de viagem rápida no menu do jogo, já que chamar o helicóptero para viajar até o próximo local acaba consumindo bastante tempo. Nas primeiras horas de jogo é legal ficar cavalgando enquanto observa os belos cenários construídos com a Fox Engine, mas depois de um tempo tudo que você quer é chegar logo na maldita missão.

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As missões em MGSV são basicamente capture/resgate/elimine o alvo; obtenha documentos importantes; ou destrua equipamentos específicos das bases. É possível ainda fazer tudo isso em uma mesma missão, mesmo que ela não exija isso para ser completada, já que todas as missões possuem objetivos secundários. Interessante é que, mesmo quando a missão é de eliminação, o jogador ainda pode optar por sequestrar o alvo e levar para a Mother Base em vez de matá-lo, dando total liberdade de ação, afinal, estamos controlando o Big Boss e é ele quem manda na coisa toda. Apesar dessa repetição de tema (sério, todas as missões seguem esse esquema), demora até que o jogo se torne cansativo, já que somos livres para decidir como vamos completar as missões. E isso inclui desde a escolha de equipamentos, acessórios, uniforme, veículos e parceiro, até o modo como vamos fazer as missões.

Geralmente, as bases a serem invadidas possuem várias entradas possíveis, algumas até bem escondidas, fazendo com que o jogador tenha que planejar muito bem qual será sua tática. E aqui surge uma das melhores mudanças na série: não somos mais obrigados a ser totalmente stealth para conseguir o ranking mais alto no cumprimento da missão. Um bônus é oferecido para quem conseguir agir dessa maneira, mas não existe penalização caso não o faça. Em algumas missões basta realizá-las rapidamente para que se consiga a graduação máxima, não importando se foi furtivo ou se chegou matando todo mundo. Além disso, o game ainda obriga o jogador a renovar suas estratégias de tempos em tempos, pois os inimigos começam a se adaptar ao seu estilo de jogo. Dê muitos tiros na cabeça e eles começam a usar capacetes; faça muitas emboscadas e eles começam a andar em duplas; ataque sempre em um determinado período do dia e eles começam a reforçar a segurança nesses períodos. E por aí vai.

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O sistema de reforços utilizado pelos inimigos também é muito interessante e utiliza bem o fator mundo aberto do jogo. Nos outros capítulos da série, quando o personagem era detectado dentro da base, vários soldados começavam a surgir do nada pra te caçar. Já em MGSV os reforços sempre vem de outras bases próximas, ou seja, é possível que você consiga eliminar todos os soldados, completar a missão e fugir do local antes dos reforços chegarem. Claro que nem sempre isso está a favor do jogador: muitos soldados ficam fazendo rondas entre as bases, utilizando jipes ou caminhões, e podem acabar complicando uma missão que estava transcorrendo bem. E, assim como em toda a série, Snake pode se esconder nesses veículos para ser transportado de uma base a outra. A diferença aqui é que a viagem é em tempo real e o jogador pode descer do transporte onde quiser, dependendo apenas da estratégia que pretende utilizar. Os cenários das bases são muito bonitos e detalhados e alguns deles são enormes. O jogador que quiser conhecer cada centímetro das bases vai levar bastante tempo.

Outra adição importante na jogabilidade é o sistema de parceiros. No começo contamos apenas com o cavalo D-Horse, que serve apenas como transporte, mas não demora para que tenhamos acesso ao cão DD e à franco-atiradora Quiet. Apesar da habilidade de DD de identificar vários inimigos ao mesmo tempo ser muito boa, acho difícil alguém não preferir jogar com a Quiet. Além de identificar inimigos (bem menos que DD), ela ainda oferece tiro de cobertura para Snake e é possível montar estratégias bem divertidas e interessantes ao utilizá-la como parceira. Para completar, é possível ainda acionar um helicóptero para que ele lance bombas em algum local ou espalhe gás do sono pela base inimiga.

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“Mas Felipe, com uma jogabilidade tão refinada assim como você pode dizer que o jogo não é perfeito?”. Bom, o problema é que o jogo se resume basicamente apenas a isso mesmo, um mero jogo de invasão de bases inimigas e administração da sua própria base, já que precisamos cuidar da Mother Base. O carisma dos personagens, que sempre foi marca registrada da série, simplesmente não existe em MGSV. Lembra dos chefes que, além de render combates épicos nos games anteriores, tinham histórias repletas de traumas que faziam nos apegar a eles? Então, praticamente não existem chefes aqui e quando existem eles são menos interessantes que uma porta. O mais próximo de chefe que aparece no jogo é a Skull Unit, um grupo de soldados super poderosos que demoram uma eternidade pra morrer e podem te matar com poucos golpes. Nenhuma história trágica por trás da transformação deles, nenhum combate épico e cheio de estratégia. Apenas atire neles até que finalmente caiam e desapareçam do cenário.

E quando todo mundo reclamou que Kiefer Sutherland iria substituir David Hayter como a voz do Big Boss? A verdade é que não fez diferença alguma, Big Boss entra mudo no jogo e sai praticamente calado. Ele é o líder de uma nação de soldados, mas quem faz todos os discursos e dá todas as ordens é Kazuhira Miller. Em alguns momentos parece até que Miller é o verdadeiro líder e Snake é apenas um soldado raso cumprindo missões suicidas. O cúmulo disso fica representado em uma determinada cena na qual Miller e Revolver Ocelot estão quebrando o pau a respeito de uma decisão e você fica lá aguardando o momento em que Big Boss vai mandar todo mundo calar a boca e tomar uma decisão. Mas este momento nunca chega, o personagem fica simplesmente assistindo a discussão calado e aceita, sem questionar, a decisão a que eles chegam. Enquanto isso, eu berrava para a TV “fala alguma coisa, Snake, aja como um líder”. A única personagem que fala menos do que Snake no jogo é a Quiet, como o próprio nome sugere.

A personalidade diferente de Big Boss até poderia ser explicada por algumas coisas dentro da história (embora mesmo isso não justifique tamanha apatia do personagem), mas Ocelot é outro que teve a personalidade bastante alterada. Nos jogos anteriores ele sempre se mostrou como um homem que gosta de falar, de se exibir, seus discursos eram sempre acompanhados de muitos gestos. Em MGS3 vemos inclusive que ele é assim desde muito jovem, mas em MGSV ele está extremamente contido. Ocelot fala sempre com uma voz calma e geralmente de braços cruzados. Chega ao ponto de diversas vezes o personagem ser a única voz sensata dentro da Mother Base. Até mesmo quando precisa torturar alguém Ocelot demonstra não gostar de fazer aquilo, sendo que nos jogos anteriores ele sempre adorou a arte da tortura. Já Kazuhira Miller parece apenas um fanático gritando o tempo todo que precisam se vingar de Skull Face e completar mais missões para ganhar dinheiro.

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Para acompanhar a falta de carisma dos personagens, MGSV conta uma história de vingança bobinha e que em nenhum momento consegue empolgar. Tudo começa com aquela já famosa cena do hospital, quando Big Boss desperta de um coma de nove anos e já sofre um novo atentado. Ao fugir do hospital, ele fica sabendo que Miller construiu uma nova Mother Base, mas que acabou sendo sequestrado e agora precisa ser resgatado. Com esta primeira missão concluída, Miller explica que eles precisam arrecadar dinheiro através de missões mercenárias, enquanto caçam Skull Face para se vingar do atentado à antiga Mother Base nove anos atrás. Do outro lado temos Skull Face com um plano mirabolante e que não faz sentido algum quando paramos pra pensar durante alguns minutos, além de um ódio mortal de Big Boss. Um ódio que nunca é explicado em momento algum do jogo. Além disso, coisas interessantes que poderiam ser exploradas pelo roteiro são simplesmente abandonadas pelo caminho, como a relação de Liquid Snake com Big Boss. E pra quem reclamava que os jogos anteriores possuíam muitas cutscenes, em MGSV elas praticamente inexistem, aparecendo apenas em alguns momentos chave. A solução para ajudar a contar a história foi a adição de dezenas de fitas K-7 com conversas entre os personagens (mas nem aqui o Snake fala muito), então os fãs que quiserem saber mais podem se preparar para ficar horas apenas escutando diálogos. Aposto que vocês vão sentir falta das cutscenes de 40 minutos.

Dividida em dois capítulos, a trama de MGSV caminha razoavelmente bem durante o primeiro, alternando de forma orgânica as missões genéricas com as missões que fazem a história andar. Aí de repente, sem muito aviso, o primeiro capítulo acaba. Os créditos sobem na tela e o jogador se desespera achando que acabou o jogo assim sem mais nem menos. Até que depois dos créditos aparece a mensagem “a seguir, no Capítulo 2…” e várias cenas do capítulo seguinte são mostradas. O problema é que quando o segundo capítulo começa logo vem uma pergunta à nossa mente: pra onde a história vai a partir daqui? E a triste resposta pra isso é que a história meio que não vai a lugar algum. Praticamente todas as tramas importantes se resolveram no capítulo anterior e a maioria das missões neste segundo capítulo são missões repetidas do primeiro, apenas com um certo aumento na dificuldade. “Você já enfrentou a Quiet na missão 11, então que tal enfrentar novamente na missão 40?” “Ah legal, ela vai se rebelar contra mim ou algo assim e vou enfrentá-la em outro cenário?” “Não, é a mesma missão do capítulo anterior, apenas com dificuldade maior, não vai mudar nada na história”.

Como se essa repetição desnecessária não bastasse, as missões inéditas do segundo capítulo demoram um pouco para abrir, sendo necessário cumprir outras antes. Então, se não quiser repetir coisas já feitas no primeiro capítulo, é bom guardar algumas missões paralelas para serem realizadas durante o Capítulo 2. Assim dá pra fazer algumas coisas inéditas (ainda que genéricas) enquanto espera as missões de história ficarem disponíveis. E o pior é que essas missões, além de não serem muito interessantes, ainda são meio que jogadas ali do nada. O final do jogo, por exemplo, está na missão 46 e ela simplesmente surge na lista sem explicação do porque. Ao escolher esta missão somos obrigados a jogar novamente TODO o prólogo do jogo, com a esperança de que muitas coisas serão mostradas de forma diferente desta vez, afinal, o nome da missão é “Verdade: O Homem que Vendeu o Mundo” (Truth: The Man Who Sold The World). Mas a única alteração aparece logo no comecinho da fase, o resto é exatamente igual ao que já fizemos no começo do jogo. E lá vamos nós jogar por quase uma hora uma missão repetida, esperando algo épico, para no final sermos “recompensados” com um plot twist que nem de longe é tão impactante quanto o Kojima quis nos fazer acreditar. Qualquer pessoa que prestou atenção ainda nos primeiros trailers de MGSV já tinha matado qual era a “grande surpresa” que o jogo tinha reservado para o final.

Os boatos na internet dizem que Kojima queria colocar cinco capítulos na versão final do jogo, com o objetivo de amarrar todas as pontas, ligando MGSV com o primeiro jogo de MSX. Porém ele já tinha estourado todos os prazos e o orçamento da produção e a Konami exigiu que o jogo fosse lançado de uma vez. Levando em conta que o Capítulo 2 é apenas um monte de missões jogadas ali a esmo, isso tem toda a cara de ser verdade. Principalmente que é possível encontrar no YouTube um vídeo com cenas inacabadas da Missão 51, que concluiria uma das tramas do jogo.

É realmente uma pena que o jogo não tenha sido concluído da forma como foi planejado, já que, da forma como foi lançado, Metal Gear Solid V: The Phantom Pain parece apenas um capítulo inacabado na grande história da série. No final das contas, o nome The Phantom Pain acabou sendo perfeito para o jogo, já que é impossível não sentir uma dor fantasma quando percebemos que tem muita coisa faltando ali.

METAL GEAR SOLID V: THE PHANTOM PAIN

Plataforma avaliada: PlayStation 4 | Desenvolvedora: Kojima Productions, a Konami querendo ou não | Publisher: Konami | Gênero: Ação

Além do PlayStation 4, Metal Gear Solid V: The Phantom Pain está disponível para PlayStation 3, Xbox 360, Xbox One e PC.

10 comentários em “Metal Gear Solid V: a dor fantasma de um game inacabado”

  1. O mais próximo de um chefe são os Skulls então?? Homem em chamas e Sahelantropous são o que pra vc??
    No mais, vc não parece conhecer os personagens como Ocelot pra não notar o pq dele “aparentar algo” nesse game, parece que vc esqueceu ou não sabe a época em que se passa o game.

      1. “Se não gostou é porque não entendeu” é a clássica resposta dos fanboys e da geração que só quer ler textos que validem suas próprias opiniões e não conseguem debater com quem pensa diferente.

    1. Os Skulls, o Homem em Chamas e o Metal Gear passam longe de ter o carisma dos chefes dos outros jogos e isso é o que foi apontado no texto.

  2. Bom texto, concordo em partes com vc, realmente fica evidente que o game foi capado por pouco mais da metade, e as missões repetidas serve somente para isso, encher o game. Por outro lado, ele é simplismente o melhor Metal Gear que já joguei, e um dos melhores games já feito de todos os tempos. Melhor junção de mundo aberto já feito, gameplay impecável, sons dublagens, on line, a adm da Mother Base, enfim mto conteúdo, fiz 30 missões no rank S, lutando pra platinar tudo, mais de 130hrs, e queria mto mais.
    Fico me perguntando se Kojima tivesse terminado essa obra máxima, seria o maior e melhor game de todos os tempos…

  3. Concordo contigo. Essa é a opinião de um fan e não de um fanboy. Nenhum metal gear vai superar o 3, sem duvida o melhor de toda a saga.

  4. foda… sou fan da série. infelizmente não joguei a versão do msx, mas joguei todas as outras do nes 8bits, sony psp,…..enfim excerto pela missão do hospital MGS5 É UM LIXO. admite porra kojima fez merda e koname só atrapalhou ainda mais para piorar. aproveitaram a expectativa dos fans e lançaram o game inacabado pois sabiam que ia dar lucro.

  5. foda… sou fan da série. infelizmente não joguei a versão do msx, mas joguei todas as outras do nes 8bits, sony psp,…..enfim excerto pela missão do hospital MGS5 É UM LIXO. admite porra kojima fez merda e koname só atrapalhou ainda mais para piorar. aproveitaram a expectativa dos fans e lançaram o game inacabado pois sabiam que ia dar lucro.

  6. “E aqui fez muita falta um sistema de viagem rápida no menu do jogo, já que chamar o helicóptero para viajar até o próximo local acaba consumindo bastante tempo”

    Como fez falta se o jogo TEM fast travel? Tem uns 21 pontos de fast travel no jogo

Comentários encerrados.